quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Carlos Drummond de Andrade


Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
seco, abafado, dificil de ler.

Quero que meu soneto, no futuro,
não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu maligno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.

Esse meu verbo antipático e impuro
há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o perdicuro.

Ninguém o lembrará: tiro no muro,
cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.



Mãos dadas

Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso á vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles considero a enorme realidade.
O presente é tao grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
Não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes o cartas de suicida,
não fugirei paras as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presente, a vida presente.

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